Segundo a Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel), o número de linhas de telefonia móvel ativas já superou os 280 milhões, para uma população de pouco mais de 204 milhões de habitantes. Recorrendo a uma matemática simples, a relação entre aparelhos e humanos é de mais de 1 celular por pessoa. É fácil observar a importância que os smartphones e semelhantes têm adquirido, pois, além dos recursos mais básicos, permitem o acesso de aplicativos de todo tipo a programas e filmes. Há casos em que o telefone móvel parece ter se tornado uma extensão do próprio indivíduo, tal a dependência desenvolvida em relação a ele. É como se, em sua ausência, faltasse algo imprescindível, provocando, inclusive, sintomas de abstinência comparáveis aos experimentados por usuários de drogas, o que foi verificado por estudos realizados em centros de pesquisa. A ansiedade provocada pode ser vivenciada com sofrimento físico e emocional.
É fácil comprovar, com uma simples observação no mundo ao redor, o que já é matéria de reportagens ou se comenta nas redes sociais (uma ironia, levando-se em conta o assunto): pais que entram no mundo virtual e esquecem dos filhos, logo ali ao lado. Às vezes, o fenômeno é duplo, com pais e filhos conectados nos modernos aparelhinhos e desconectados da vida real. O mesmo se verifica em restaurantes, entre amigos e casais, nas salas de aula de qualquer nível, afinal, as crianças começam brincando com o celular dos adultos, logo ganham um para si (aí acaba o incômodo compartilhamento), muitas vezes, entrando precocemente no mundo virtual. A necessidade de se manter conectado, sob o risco de perder uma atualização, uma notícia, uma piada, pode provocar a desconfortável sensação de se estar à parte da vida, perdido e solitário. Essa sensação de desamparo torna-se real, pela percepção exagerada da importância dada a tal tipo de contato.
Não se trata de julgar as pessoas e travar uma guerra com o espaço virtual. A internet, com todas as suas possibilidades, é sala de aula, com os cursos à distância; local de lazer e diversão, com músicas, séries e publicações, para todos os gostos, e de cultura, com museus e obras de arte, além de livros, ao alcance de um download; substitui os pontos de encontro presenciais, aproximando pessoas que vivem distantes umas das outras ou estão impedidas de se ver, por problemas físicos, como doença que impossibilita a locomoção. Expondo dessa forma, onde está o problema, que risco os chamados gadgets podem trazer ao indivíduo? A questão, como em outras situações, diz respeito ao padrão de comportamento, quando o uso dos aparelhos escapa ao controle e torna a pessoa dependente dos mesmos. Ou seja, quando o problema é não apenas o tempo que se dedica às parafernálias eletrônicas, mas o tipo de interação que se estabelece.
Buscar prazer é saudável e indicado para o bom funcionamento geral do indivíduo, mas o exagero de qualquer coisa desloca a satisfação que poderia ser obtida para o sofrimento de uma necessidade que nunca se satisfaz ou se basta. É preciso intensificar e prolongar o uso da internet para alcançar o prazer e experimentar a antiga euforia, significando que as doses têm que ser aumentadas. Crianças e adolescentes tornam-se reféns dos jogos eletrônicos e das redes sociais, isolando-se da vida real, ao ter a atenção e comunicação limitadas ao computador, e desconsiderando as tarefas diárias, a prática de esportes e os interesses próprios da faixa etária. E até o corpo padece, pois o sedentarismo causa obesidade (e doenças decorrentes), que leva à baixa autoestima e a um maior isolamento. Adultos desconectam-se de relacionamentos presenciais, e indivíduos de todas as idades empobrecem suas hablidades sociais, o que pode ser comprovado por conflitos e ataques grosseiros, cada vez mais frequentes, nas redes sociais. É fato que olhar no olho exige que se reflita mais sobre o que de diz ou faz e muda o foco, pois perde o distanciamento que a internet permite.
Não se trata de retroceder a uma existência pré-virtual, ignorando os aspectos positivos dessa ferramenta, ou culpar a internet pelos males do mundo. Quase nada é bom ou mal fora de um contexto e sem levar em consideração o que está envolvido. Não são os jogos eletrônicos nem as redes sociais os responsáveis pelas consequências negativas nas vidas de crianças e adultos (alguns deles colocam o emprego e a vida afetiva em risco à medida que mergulham cada vez mais no universo virtual), mas o motivo que torna essa viagem não só necessária, mas essencial. O que se pretende anestesiar, de que emoções ou conflitos se tenciona escapar, de que angústias se planeja afastar? No final, a pergunta é: qual o problema real no âmbito emocional? É preciso refletir sobre as causas, o que leva à necessidade que não chega a ser suprida, de novo e sempre buscada nas teclas e nas telas, nas mensagens e nos vídeos, numa história que parece ser feita, senão de nuvens, de bytes e pixels, em lugar de corpos, risos e, por que não?, suor e lágrimas.
O vídeo diz tudo:
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